sábado, 23 de maio de 2009

Amargo e Verde.


Levantou-se apressado para não perder tempo algum, seus pensamentos já maquinavam planos para o dia. Tudo o que necessitava, faria. Não se importava com mais nada, apenas com sua própria necessidade. Precisava aumentar sua conta bancária , seu gordo saldo ainda não era suficiente, precisava de uma grande idéia, algo que revolucionaria a história de empreendimentos e o dinheiro entraria fácil como água.
Não poderia apreciar o café em casa. A vasta mesa com frutas frescas, manteiga importada e pães selecionados, ficaria para outra oportunidade.
Passou pela saleta onde filho e esposa saboreavam aquelas delicias.
- Bom dia, vou para o escritório.
O "bom dia" seco era solto ao vento sem perceber quem realmente ocupava as cadeiras da mesa. Era apenas um “bom dia” de obrigação ou por mero costume, pois não necessitava ser simpático ou carismático, era seu próprio patrão. Imaginava que sua família não necessitava de atenção. Mantinha os melhores carros, um apartamento de alto padrão e caso adoecesse, os melhores médicos da região curariam e receitariam. Era ele próprio quem favorecia isso, com muito trabalho, apenas trabalho... Continuava pensando, maquiando mais trabalho, mais dinheiro...
Chegou ao escritório e tomou seu café matutino, preto e amargo.
- Açúcar é para pessoas fracas, que não suportam a realidade da vida e a escondem com um prazer doce.
O mesmo "bom dia" obrigatório e sem expressão foi solto pela sua boca.
Sua sala era escura, com detalhes de madeira e sem cor alguma.
Ligou a TV. Poderia monitorar todos que trabalhavam na empresa por meio de câmeras dispostas em todos os lugares, em todos ambientes e até mesmo no banheiro. Ele mandava, era onipresente, onipotente...
Assistia a TV vislumbrando sua obra. Na tela os funcionários trabalhavam como formigas e nada poderia sair da sua normalidade.
O telefone tocou, era sua secretária:
- Um funcionário quer conversar com o senhor.
Uma das formigas deixou sua cadeira e pela TV era possível ver a sala vazia. Era um dos seus melhores funcionários, ajudou-o a crescer e desenvolver suas habilidades na empresa por simples comodismo e por dó. O rapaz morava em um bairro simples e demorava 3 horas para chegar na empresa dentro de um ônibus lotado, tinha 2 filhos e sua mulher era uma das empregadas domésticas de seu apartamento.
- Vim pedir ao senhor um ajuste no meu horário, minha carga horária dobrou, os ofícios aumentaram, entro às 8 da manhã e saio ao anoitecer. Estou doando-me por completo para a empresa, porém não tenho tempo para levar meu filho ao médico.
Demitiu o rapaz. "Agora ele tem tempo livre para levar seu filho ao médico e não me incomodará mais" pensou.
Abriu seus e-mails com a maior calma e despreocupação. Haviam 5 avisos marcados em vermelho. Foram lidos e marcados como importante, por ele mesmo. Todos eles continham o aviso: "Visitar mamãe no hospital do centro". Havia esquecido de visitá-la. Ligou para a secretária:
- Ligue para minha irmã e repasse a ligação a mim.
Não se recordava o telefone de sua mãe e muito menos de sua irmã, havia anos que não se encontravam, mas a secretária saberia.
O telefone toca, porém desta vez um som mais sinfônico que o normal. Era sua irmã.
Perguntou sobre sua mãe, como ela estava, se estava bem e o que poderia fazer para ajudar.
- Luis, o que você tem na cabeça? Eu deixei 3 mensagens na caixa postal do seu celular avisando do enterro da mamãe ontem. Imaginei que não foi pois não queria chorar diante dos amigos da família, afinal você nunca chorou na nossa frente, não é? Onde você esteve esse tempo todo?
- Não sei- respondeu ele- Eu tenho muitas reuniões, serviços, pessoas e detalhes a resolver que li seus e-mails mas sempre deixava para o próximo dia para ir visitá-la.
Desligou o telefone sem dizer adeus.
Pegou o celular: 3 mensagens na sua caixa postal.
A voz robótica da sua irmã, na primeira mensagem avisava que o estado de saúde de sua mãe havia piorado. Na segunda mensagem era o aviso do funeral. E a última mensagem dizia: "Luis, não te vi no velório. O que aconteceu? Acharam uma caixinha que a mamãe preparou antes de partir endereçada a você. Fui nos eu apartamento levar, mas você não estava. Deixei com sua mulher."
PIIIIII, apitou o final da mensagem.
Saiu desesperado da empresa. Quando chegou em seu apartamento, sua mulher e seu filho estavam sentados no sofá e na mesinha de centro, estava à caixinha que era verde, verdíssima. Abriu cuidadosamente e dentro dela havia uma carta:
" Meu filho, serei rápida para não tomar-lhe muito tempo. Esta caixinha é onde você guardava suas economias e mesadas, se recorda? Quando tinha 21 anos e saiu de casa em busca do seu futuro, você me disse que por todo amor e todo carinho que eu te dei, eu seria recomeçada com muito dinheiro que você ganharia, porém eu resolvi te dar todo o carinho e atenção que recebi de você durante todo este tempo."
Dentro da caixa havia 3 moedas, um relógio e outro bilhete: " Estas moedas foram as únicas que consegui economizar: a primeira foi no primeiro ano após sua saída, que veio me visitar pois ainda ganhava pouco e não tinha dinheiro para as despesas, a segunda quando seu pai faleceu e você era inda um estagiário da empresa e a terceira é para hoje que tenho esperança que virá me ver, mas como é mais certo que não virá, deixei este relógio, que era do seu pai, como um presente a você. Talvez só assim você perceba que o tempo está se esgotando. Cada minuto que passa é menos uma pessoa que te ama saindo da sua vida, é menos um segundo para dizer eu te amo para sua mulher, é menos um segundo para ligar para sua irmã e perguntar se ela está bem. E por fim, meu filho, este relógio mostra que você ainda tem tempo. Tempo para ver que funcionários da sua empresa tem sentimento e não são máquinas, tem tempo para ter um filho que sinta orgulho do seu pai e uma mulher que sinta-se amada por seu marido. E você ainda tem tempo para que você seja um homem inteligente para perceber que lágrima não é vergonha. Eu te amo.”
E quando menos se esperava, uma gota bem pequena do liquido que expressa os sentimentos saiu dos seus olhos. Uma lágrima diferente de qualquer outra, era verde, verde como a caixinha.






sábado, 9 de maio de 2009

"Fui morar na estação da Luz, pois estava tudo escuro dentro do meu coração"



Eu gostaria de tempo.Tempo que não consigo alcançar. Tempo para desvendar São Paulo e quem sabe um dia me apaixonar!Talvez este seja um melodrama desses filminhos de cinemas cults, mas ainda não consigo pensar nessa cidade e rir de contente.Já dizia Nelson Rodrigues : "A pior forma de solidão é a companhia de um paulistano". E quem é Paulistano? Tenho amigos paulistas, conhecidos nordestinos, uns e outros cariocas. Mas paulistano, paulistano mesmo, está como encontrar agulha em palheiro.Às vezes da vontade de sumir! De sair por ai, seja Floripa, Rio, Amazonas... Sumir desse ter e não ter, de ser e não ser, de gostar e não gostar. Sumir do " Eu to na sua frente", desta competição onde não há percepção de quem ganha realmente é só você! E ninguém tem nada a ver com isso.Mas e lá? Seria eu um pouco capaz de ser feliz? Não sei! Me assusta pensar que São Paulo pode me imundar de felicidade, ou me carregar de pesadelos.Mas se pensas que sou fraco a ponto de chorar e voltar, de não tentar, engana-se!Vou entre a Sé e até o ponto final desse metrô! Embarcarei olhando aqueles mapas coloridos que me mostram onde chegar, mas vou descer no metrô Consolação, que fica na linha verde , a cor da esperança